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Cuidados no diagnóstico de Hipertensão Arterial Sistêmica

hipertensão arterial sistêmica

Hipertensão arterial sistêmica (HAS), a famosa “pressão alta”, é uma doença relacionada a múltiplos fatores genéticos e ambientais que acomete cerca de 1 a cada 3 pessoas no Brasil.

 

Embora comum, e talvez por isso uma comorbidade “pouco importante” para o olhar superficial de estudantes ou profissionais da área da saúde, receber um diagnóstico de uma doença crônica que requer tratamento para o resto da vida não é, de forma alguma, trivial na perspectiva de um paciente.

 

Medicamente falando, também, não é nada simples fazer o diagnóstico, afinal uma medida de PA elevada não necessariamente significa que o paciente carregue essa doença. Cabe aqui então definirmos o que é a HAS: “Doença crônica marcada por níveis de pressão arterial sustentadamente elevados, que se associam a maior risco de complicações cardiovasculares

 

Uma medida isolada pode ser devida a um esforço físico recente, e até mesmo fatores emocionais – por isso o “sustentadamente”. Devemos ter a medida realizada em pelo menos duas ocasiões, fora de um ambiente estressor, para chegarmos ao diagnóstico. Além disso, devemos sempre lembrar que o problema da pressão elevada não é o seu valor em si, mas sim, as consequências patológicas futuras geradas pela mesma, por isso o “associados a risco cardiovascular”. Os valores de corte e classificações em estágios variam de acordo com diferentes sociedades, baseados em vários e grandes estudos populacionais, e não é objetivo desse texto apresentar esses valores.

 

Com o conceito em mãos, as coisas se tornam mais claras, porém na prática, muitos desafios impactam a prática clínica. Suponha o caso desses 3 pacientes:

 

  1. João, de 50 anos, teve PA aferida elevada numa consulta de rotina. No retorno, diz que mediu em casa diversas vezes com o aparelho validado e calibrado recentemente de sua esposa, a Dona Rita, que é hipertensa, e que sua pressão estava sempre baixinha, menor que 120×80 mmHg. Contudo, quando você mede de novo, a PA está alta.
  2. Maria, 44 anos, irmã da Dona Rita, quando soube do diagnóstico dela, veio algumas vezes à casa dela medir sua pressão. Sempre acima de 150X100 mmHg, ficou preocupada e procurou seu consultório para saber se também tinha a tal da pressão alta. Na sua medida, feita com técnica correta e com paciente calma, o resultado obtido foi normal. Mas como?
  3. Dona Rita, hipertensa no estágio 1, com a PA sempre controlada nas medidas que faz em casa e na UBS com sua amiga enfermeira, local que frequenta diariamente, pois lá trabalha na limpeza. Contudo, nas últimas consultas médicas a PA fica elevada, nos níveis do estágio 2! Ela te questiona “por que disso doutor, se eu tomo as medicações tudo certinho e não tô exagerando no sal?”.

 

O que pode estar acontecendo nessas situações? Não são exemplos raros ou de outro mundo, mas processos comuns no dia a dia da prática médica. Trata-se de 3 fenômenos que precisamos ter conhecimento: A HAS do jaleco branco, a HAS mascarada e o efeito do jaleco branco.

 

A HAS do jaleco branco é o que está acontecendo com seu João e tem prevalência global estimada de 13%. São pessoas saudáveis, sustentadamente normotensas. Porém, por mecanismos ainda não tão claros, tem PA elevada em consultório. Mais comum em jovens, idosos, sexo feminino. Não há evidência de benefício de tratar com remédios esses pacientes.

 

A HAS mascarada é o oposto. São pacientes cronicamente hipertensos que, novamente por mecanismos desconhecidos, possuem PA alterada no consultório. Essa forma tem risco cardiovascular elevado e pode ter o diagnóstico atrasado.

 

O efeito do jaleco branco (não confunda com HAS do jaleco branco) ocorre em pacientes sabidamente hipertensos, que tem medidas discordantes, sendo maiores (20 mmHg a mais na PAS ou 10 mmHg a mais na no consultório médico do que em casa). Não vai mudar o diagnóstico de ninguém, porém pode induzir ao erro de alterar o estágio (achar que é uma HAS mais grave do que é na verdade), o que pode levar a condutas terapêuticas desnecessárias.

 

Como a medida em casa não é confiável como dado médico, uma possibilidade diagnóstica é a MAPA (monitorização ambulatorial da pressão arterial). É um dispositivo que fica no paciente e mede sua PA a cada 20 minutos por 24 horas. Ela pode ser a resposta para casos de dúvida ou suspeita de hipertensão do jaleco branco ou hipertensão mascarada.

 

Podemos resumir tudo que falamos numa tabelinha simples:

Vamos fechar esse texto com alguma dicas para mandar bem na abordagem da pressão alta no seu dia a dia como estudante ou profissional da saúde?

 

  1. Meça a PA dos seus paciente, pelo menos uma vez por ano;
  2. Atente-se para a semiologia correta da aferição da PA, considerando o preparo do paciente, a técnica correta e equipamento calibrado;
  3. Use o manguito do tamanho adequado ao braço do seu paciente;
  4. Numa primeira consulta, é bom aferir a PA nos dois membros superiores e considerar o maior valor;
  5. Suspeite de HAS do jaleco branco e de HAS mascarada quando houverem medidas discordantes em casa e no ambiente médico, e solicite MAPA se necessário;
  6. Não diagnostique HAS com uma medida isolada de PA;
  7. Pratique uma medicina centrada na pessoa e acolha as preocupações e medos do paciente quando for necessário dar o diagnóstico de hipertensão arterial a alguém;
  8. Valorize sempre o tratamento não farmacológico da HAS, que é o único “sem contraindicações”;
  9. Certifique-se da adesão do paciente ao tratamento, não considerando os pacientes como “maus” em caso de adesão irregular, mas procurando entender o que leva a isso: o paciente compreendeu mesmo seu diagnóstico? Ele sabe ler a receita? Ele tem acesso ao medicamento? Há algum outro fator impeditivo?
  10. Atualize-se sempre! HAS não é “assunto batido”, informações, pesquisas e tratamentos novos sempre aparecem nos meios de divulgação científica.

 

 

 

Por Gustavo Boog 

 

 

 

 

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