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CBEM: Diabetes Mellitus, Obesidade e Tireóide

Trouxemos uma cobertura especial sobre os destaques do Congresso Brasileiro de Endocrinologia e Metabologia, mais conhecido como CBEM, que aconteceu no mês de Outubro/24.

O evento contou com palestras com os maiores nomes da endocrinologia nacional, além de escolha criteriosa de temas atuais e alguns polêmicos, mas que se fazem essenciais para o avanço da especialidade, combatendo condutas e práticas não baseadas em evidências, que temos visto aos montes.

Tentaremos aqui comentar sobre uma palestra de cada área da Endocrinologia que foi abordada no congresso, de forma sucinta e direta, selecionando temas interessantes e atuais.

Diabetes Mellitus

Uma das palestras de destaque discutiu a publicação previamente realizada no New England Journal of Medicine (NEJM) que avaliou a semaglutida em pacientes com Insuficiência Cardíaca em indivíduos com obesidade e diabetes tipo 2.

Sabemos que a insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada, ou HFpEF, é muito prevalente em pacientes com obesidade e diabetes tipo 2, caracterizada por uma carga significativa de sintomas.

Apesar da associação entre obesidade, diabetes tipo 2 e HFpEF, não existiam terapias aprovadas especificamente para este grupo.

Análises

Estudos anteriores sugeriram benefícios potenciais dos agonistas do receptor GLP-1 na redução de peso e fatores de risco cardiovascular, levando ao interesse na semaglutidam² e histórico de diabetes tipo 2. Esses pacientes foram randomizados para receber semaglutida ou placebo. Os desfechos primários incluíram: mudança no escore do questionário Kansas City Cardiomyopathy Questionnaire Clinical Summary Score (KCCQ-CSS) e percentagem de mudança no peso corporal. Os desfechos secundários incluíram mudança na distância percorrida em 6 minutos, desfechos compostos hierárquicos (incluindo morte e hospitalização) e alterações nos níveis de proteína C-reativa (CRP).

A análise estatística da eficácia foi realizada utilizando um modelo de estimativa de política de tratamento, que leva em conta a interrupção do tratamento e dados faltantes através de métodos de imputação. Os resultados primários mostraram que a mudança média no KCCQ-CSS foi +13.7 pontos no grupo semaglutida, comparado a +6.4 pontos no grupo placebo, com uma diferença estimada de 7.3 pontos e um valor P menor que 0.001. A mudança percentual média no peso corporal na semana 52 foi de -9.8% para o semaglutida, em comparação a -3.4% para o placebo, resultando em uma diferença estimada de -6.4% (P<0.001). Nos desfechos secundários, a melhoria na distância percorrida em 6 minutos foi significativamente maior no grupo semaglutide (+12.7 m vs. -1.6 m; P=0.008). O desfecho composto hierárquico mostrou um índice de vitória de 1.58 (P<0.001) a favor do semaglutide. Os níveis de CRP diminuíram em -42.0% nos pacientes que utilizaram semaglutida, em comparação a -12.8% no grupo placebo (P<0.001).

Em termos de segurança, eventos adversos graves ocorreram em 17.7% do grupo semaglutide contra 28.8% do grupo placebo (P=0.002). As taxas de mortalidade foram semelhantes entre os grupos, com o grupo semaglutida reportando 6 óbitos por causas cardiovasculares.

Conclusão

Em conclusão, a semaglutida melhorou significativamente os sintomas relacionados à insuficiência cardíaca, as limitações físicas e reduziu o peso corporal em pacientes com HFpEF relacionada à obesidade e diabetes tipo 2, ao longo de 52 semanas, em comparação ao placebo. Esses achados apoiam o uso potencial do semaglutida no tratamento dessa população de pacientes, abordando uma lacuna notável nas terapias existentes para HFpEF.

Entre as forças do estudo, destacam-se a grande coorte internacional e o design robusto, que aumentaram a confiabilidade da pesquisa. A escalabilidade clara dos desfechos primários e secundários aumentou a precisão dos resultados. No entanto, as limitações incluem a falta de informações sobre os efeitos a longo prazo além das 52 semanas e o possível viés de seleção devido ao desenho do ensaio, que pode limitar a generalização dos resultados. Direções futuras incluem a necessidade de mais estudos para avaliar os impactos a longo prazo, o papel da semaglutida em várias subpopulações de pacientes e sua segurança em cenários clínicos do mundo real fora de um ambiente controlado.

A relevância clínica deste estudo fornece evidências de que a semaglutida pode melhorar a qualidade de vida e os resultados clínicos em pacientes com HFpEF relacionada à obesidade e diabetes tipo 2, potencialmente orientando a prática clínica para incorporar agonistas do receptor GLP-1 como uma opção de tratamento padrão para essa condição de saúde séria.

Obesidade

O destaque da obesidade foi uma mesa de discussão sobre o novo guideline brasileiro de Doença Hepática Gordurosa Metabólica, a MASLD. A MASLD abrange um espectro de doenças hepáticas que vai desde a esteatose simples até cirrose e carcinoma hepatocelular.

A importância de abordar essa condição é destacada pela sua crescente incidência global, o que torna essencial o estabelecimento de diretrizes para triagem, diagnóstico, tratamento e acompanhamento.

Tratamentos

Foram formuladas 48 recomendações específicas, abordando diversas dimensões do tratamento, incluindo 11 recomendações de triagem, 9 de acompanhamento, 14 para tratamento não farmacológico, e 14 para tratamentos farmacológicos e cirúrgicos.

As principais descobertas da literatura sobre MASLD incluem a sugestão de triagem inicial em indivíduos com um índice de massa corporal (IMC) acima de 25 kg/m², utilizando medidas não invasivas como níveis de transaminases e técnicas de imagem, ao invés de se basear apenas na medição de enzimas hepáticas simples.

O escore FIB-4 é uma ferramenta útil para avaliar a fibrose, em conjunto com modalidades de imagem, e a elastografia transiente controlada por vibração é recomendada para uma avaliação mais precisa da fibrose, quando necessário. Quanto às intervenções farmacológicas, a liraglutida e a semaglutida mostraram resultados promissores na melhoria da esteato-hepatite sem progressão adversa da fibrose. Os inibidores de SGLT2 são recomendados para a redução da gordura hepática em pacientes com diabetes tipo 2 e MASLD.

A pioglitazona é também opção para melhorar a esteatose e a fibrose em indivíduos com DM. A vitamina E pode ser uma opção para o manejo da esteato-hepatite em pacientes não diabéticos com fibrose avançada. No que diz respeito às opções cirúrgicas, a cirurgia bariátrica, especialmente o bypass gástrico em Y de Roux e a gastrectomia em manga, foram associadas a reduções significativas na esteatose e na fibrose em pacientes com obesidade classe 2 e 3.

Conclusão

As diretrizes sublinham a necessidade de estratégias abrangentes para o manejo da MASLD que se adaptem ao contexto específico de cada paciente, promovendo melhores desfechos clínicos e qualidade de vida, além de reduzir complicações hepáticas a longo prazo associadas a esse distúrbio metabólico. A relevância clínica dessas recomendações é que elas podem ajudar os profissionais de saúde a criar estratégias de intervenção direcionadas para a MASLD, resultando em melhores desfechos para os pacientes. Monitoramento regular e abordagens de tratamento personalizadas que considerem os fatores de risco individuais são cruciais para o manejo eficaz da MASLD.

Como perspectivas futuras, a exploração de novos agentes terapêuticos e intervenções multimodais é encorajada para otimizar ainda mais as estratégias de manejo da MASLD, proporcionando aos clínicos as informações necessárias para melhorar eficazmente os cuidados aos pacientes.

Tireóide

Na sessão sobre tireoide, o destaque foi a mesa de debate sobre a necessidade ou não do tratamento do hipotireoidismo subclínico.

Apesar de todos esses pontos, o artigo recomenda em seu fluxograma “considerar” o tratamento em pacientes idosos com hipotireoidismo subclínico diante de sintomas atribuíveis ao hipotiroidismo, positividade de anti-TPO, níveis crescentes de TSH ou T4 livre no limite inferior da normalidade e na presença de fatores de risco para doença coronariana. Além disso, recomenda tratar casos com TSH > 10 mUI/L. Não mencionado no congresso, mas tivemos revisões mais recentes publicadas na Thyroid sugerindo redução de desenvolvimento de doenças cardiovasculares em pacientes com hipotireoidismo subclínico.

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