Esclerose Lateral Amiotrófica: entenda mais!

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esclerose lateral amiotrófica
esclerose lateral amiotrófica

A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença neurodegenerativa implacável que afeta os neurônios motores, células nervosas responsáveis por controlar os movimentos voluntários dos músculos. 

Como reconhecer a ELA?

Ao lado de enfermidades como Parkinson e Alzheimer, a ELA figura entre as principais doenças neurodegenerativas, representando um desafio significativo tanto para os pacientes quanto para a comunidade médica. 

A ELA pode ser caracterizada como uma doença do neurônio motor (DNM) que leva à degeneração progressiva do sistema motor em múltiplos níveis: bulbar, cervical, torácico e lombar.

Para entender melhor o funcionamento dos neurônios motores, vamos revisar os conceitos abaixo:

  • Neurônios Motores Superiores (NMS): Localizados na área motora do cérebro (giro pré-central), também conhecidos como primeiro neurônio. 
  • Neurônios Motores Inferiores (NMI): Situados no tronco cerebral e na porção anterior da medula espinhal, referidos como segundo neurônio.
Representação dos neurônios motores inferiores e superiores. Fonte: Pinterest.

A comunicação eficaz entre NMS e NMI é essencial para a contração muscular voluntária. Os NMS enviam mensagens químicas (neurotransmissores) que regulam a atividade dos NMI. Os NMI no tronco cerebral ativam músculos da face, boca, garganta e língua (região bulbar), enquanto os NMI na medula espinhal controlam os músculos voluntários do restante do corpo, incluindo membros, tronco, pescoço e diafragma.

Na ELA, ocorre a degeneração tanto dos NMS quanto dos NMI. Acredita-se que, no momento do primeiro sintoma, uma perda significativa – mais de 80% – dos neurônios motores já tenha ocorrido. Essa perda progressiva reflete-se nos achados clínicos relacionados à disfunção desses neurônios em diferentes regiões.

O Cenário Brasileiro 

O Protocolo de 2021, da Organização Mundial da Saúde,  destaca a incidência da ELA, mencionando que ela varia globalmente.

Sua incidência na população é heterogênea e varia de 0,73 a 1,89 casos por 100.000 pessoas ao ano no sul da Ásia e no norte da Europa, respectivamente (1) (PMID: 27185810) (2,3). A idade é o fator preditivo mais importante para a sua ocorrência, sendo mais prevalente nos pacientes entre 55 e 75 anos de idade.

A maioria dos casos (mais de 90%) é esporádica, enquanto uma menor porcentagem é familiar, frequentemente com herança autossômica dominante.

O quadro clínico da ELA

Os sintomas da ELA resultam diretamente da perda de neurônios motores no córtex (NMS) e nos núcleos do tronco encefálico ou corno anterior da medula (NMI). Vamos ver um resumo dessas apresentações: 

Neurônio motor superior (NMS)Neurônio motor inferior (NMI)
BulbarIncontinência emocional (choro e riso incontroláveis)Disartria flácida
Disartria espásticaDisfagia
Disfagia (especialmente fase oral)Atrofia e fasciculações da língua
Hiperreflexia (masseter, orbicular da boca, refluxo nauseoso exacerbado) 
EspinhalHiperreflexia tendinosaFraqueza
EspasticidadeAtrofia muscular
Sinal de BabinskyFasciculações
Redução da agilidadeCâimbras

Além desses sinais e sintomas motores diretos, também temos achados clínicos indiretamente relacionados à doença, como alterações psicológicas e do sono, constipação, sialorreia (excesso de saliva), espessamento de secreções mucosas, sintomas de hipoventilação crônica e dor. É fundamental ressaltar que a disfunção sensitiva (perda de sensibilidade) é considerada incompatível com o diagnóstico de ELA, a menos que seja parte de outro distúrbio subjacente. Alterações cognitivas podem ocorrer em até 50% dos pacientes, e quadros de demência, embora incomuns, tendem a se assemelhar à demência frontotemporal.

O diagnóstico, especialmente em estágios iniciais com sintomas focais, pode ser desafiador e exige a presença de sinais em múltiplas regiões e investigações seriadas. O tempo médio entre o início dos sintomas e a confirmação diagnóstica é de aproximadamente 10 a 13 meses.

Abordagens Terapêuticas

O tratamento da ELA baseia-se em duas frentes principais: o tratamento específico, voltado para a modificação do curso da doença, e o tratamento não medicamentoso e sintomático, focado na melhoria da qualidade de vida e no manejo das complicações.

  1.  Tratamento Específico: O Papel do Riluzol

 O Riluzol é, até agora, o único medicamento com eficácia comprovada e registro na ANVISA para o tratamento específico da ELA. Várias outras terapias foram testadas, mas não demonstraram eficácia modificadora da doença.

 O esquema de administração do Riluzol é de 50 mg, por via oral, a cada 12 horas, uma hora antes ou duas horas após as refeições. Os benefícios esperados com o uso do Riluzol incluem uma leve melhora dos sintomas bulbares e da função dos membros, além de um aumento na sobrevida. O tempo de tratamento é indeterminado e depende da tolerabilidade do paciente.

É crucial estar atento às contraindicações do Riluzol, que incluem insuficiência renal ou hepática, outras doenças graves ou incapacitantes, outras formas de doenças do corno anterior medular, demência, distúrbios visuais, autonômicos, esfincterianos, gravidez ou amamentação, ventilação assistida e hipersensibilidade ao medicamento. O monitoramento do tratamento inclui a realização periódica de exames, como hemograma, plaquetas e enzimas hepáticas.

  1. Tratamento Não Medicamentoso e Sintomático

Na ausência de uma cura, o suporte não medicamentoso e o tratamento sintomático são a base do cuidado ao paciente com ELA, visando otimizar a qualidade de vida e a autonomia. É evidente a importância da equipe multidisciplinar e dos cuidados paliativos desde cedo 

  • Suporte Ventilatório:A insuficiência respiratória é a principal causa de morte na ELA. O suporte ventilatório, especialmente a ventilação não invasiva (VNI), é a conduta terapêutica não medicamentosa que mais aumenta a sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes. Entre todas as condutas terapêuticas não medicamentosas, o suporte ventilatório não invasivo, nas suas várias modalidades, é a que mais aumenta a sobrevida e a qualidade de vida do paciente com ELA, sendo inclusive possivelmente superior ao uso de riluzol (22).
  • Suporte Nutricional: A disfagia e a perda de peso são comuns e impactam a sobrevida. A orientação nutricional precoce e a consideração de vias alternativas de alimentação, como a Gastrostomia Endoscópica Percutânea (GEP), são cruciais. A GEP ajuda a manter o peso e melhora a qualidade de vida, sendo recomendada em estágios iniciais ou conforme a progressão da disfagia e a função respiratória (CVF em torno de 50% do predito).
  • Suporte de Mobilidade e Acessibilidade: A fisioterapia motora visa otimizar funções, prevenir complicações da imobilidade (contraturas, dor, constipação) e maximizar a autonomia. Exercícios leves são benéficos, mas exercícios excessivos ou com carga devem ser evitados para não gerar fadiga ou acelerar a degeneração neuronal. O uso de órteses e a adaptação para cadeiras de rodas, conforme a progressão da doença, também são abordados como formas de auxiliar o paciente em suas atividades diárias e deslocamento.
  • Suporte de Comunicação: Dificuldades na fala (disartria, disfonia) são frequentes e impactam a comunicação. A atuação fonoaudiológica é essencial desde o início para auxiliar na adaptação e, quando necessário, indicar recursos de Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA). A perda da comunicação efetiva é um dos piores aspectos da doença, levando a isolamento social e impacto psicológico. A avaliação e terapia fonoaudiológica ajudam a manter o paciente comunicativo.
  • Suporte Multidisciplinar: O acompanhamento por uma equipe especializada (neurologista, pneumologista, gastroenterologista, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos, fonoaudiólogos, assistentes sociais) comprova-se associado a uma maior sobrevida (7 a 24 meses a mais) e melhor qualidade de vida.
  • Atendimento Domiciliar: Conforme a doença progride e a mobilidade diminui, o atendimento domiciliar se torna uma opção terapêutica importante, muitas vezes mais eficiente e com melhores resultados que internações hospitalares. Sua missão é melhorar a qualidade de vida, sobrevida, independência, autonomia e conforto psicológico do paciente.
  1. Tratamento Medicamentoso Sintomático

Em resumo, podemos especificar o tratamento mais específico no quadro abaixo:

PROTOCOLO CLÍNICO E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS DA ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA. Fonte: Ministério da Saúde (2021). 

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