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Saiba como a avaliação do adolescente é feita e treine com questões

A adolescência, período compreendido entre 10 e 20 anos de idade de acordo com a Organização Mundial da Saúde, demanda do médico examinador a capacidade de construir uma boa relação médico-paciente. Para isso, é necessário esclarecer e garantir que a consulta será baseada no tripé da confidencialidade-privacidade-sigilo. Nesse sentido, é válido ressaltar que, muitas vezes, o médico pode encontrar uma situação de manejo de conflito com o acompanhante do adolescente devido ao sigilo médico

O texto a seguir tem o objetivo de resumir o assunto descrevendo os principais pontos para levar em consideração. 

Sigilo médico

De acordo com o Código de Ética Médica, é vedado ao médico: 

Art. 74. Revelar sigilo profissional relacionado a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que o menor tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente.

Observa-se que o artigo condiciona a autonomia e o sigilo médico a dois principais pontos: capacidade de discernimento do menor e isenção de riscos resultantes da não revelação.

Logo, vê-se que os motivos de quebra de sigilo estão embasados em situações em que há risco para o adolescente, como, por exemplo, situações de violência e doenças graves. 

Quando surge uma situação que justifica a quebra de sigilo durante uma consulta com um adolescente, é importante seguir uma abordagem cuidadosa e respeitosa. 

Veja um exemplo de como proceder:

1. Encorajamento do adolescente:

    – Incentive o adolescente a ser o portador da informação

    – Explique a importância de compartilhar a situação com os responsáveis

2. Benefícios desta abordagem:

    – Promove a autonomia do adolescente

    – Fortalece a confiança entre o profissional de saúde e o paciente

    – Facilita o envolvimento da família nos cuidados necessários

3. Consentimento do adolescente:

    – Busque obter o consentimento do adolescente para a quebra do sigilo

    – Explique que esta é a melhor forma de garantir seu bem-estar e saúde

Lembre-se: este exemplo de abordagem visa preservar a relação de confiança com o adolescente, ao mesmo tempo em que garante o suporte familiar necessário para seu cuidado integral.

Dica: sempre que possível, ofereça apoio ao adolescente durante o processo de revelação aos responsáveis, estando disponível para mediar a conversa se necessário.

Avaliação do adolescente

Algumas literaturas recomendam que a anamnese do adolescente divida-se em 3 tempos, no qual o primeiro é realizado na companhia do acompanhante e os dois seguintes são feitos apenas com o adolescente, sem a presença do acompanhante. É possível que haja divergências sobre tal divisão dependendo da literatura, mas, para este texto, a principal referência foi aquilo dito no livro Propedêutica Médica da Criança ao Idoso, 2ª edição. 

Para o momento da consulta em que o paciente é avaliado isoladamente, recomenda-se que o profissional converse com o acompanhante no início da consulta sobre os 3 tempos supracitados, para evitar constrangimentos e possíveis conflitos com o pedido de saída inesperado no decorrer da anamnese. 

Primeiro tempo

Com o auxílio do acompanhante, é feita a identificação, levando-se em consideração a identificação do acompanhante também. Além disso, realiza-se a queixa e duração (QD), a história pregressa da moléstia atual (HPMA), antecedentes tanto pessoais quanto familiares e hábitos e vícios. 

Neste momento da consulta avalia-se informações as quais, muitas vezes, o adolescente não sabe ou não se lembra e, por isso, a presença do acompanhante é necessária. 
Sendo assim, é importante investigar a situação vacinal, antecedentes obstétricos (pré-natal, parto e pós-parto), desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM), doenças de infância, hospitalizações, cirurgias, condições socioeconômicas e culturais e condições crônicas e de caráter hereditário na família.

Segundo tempo

No segundo tempo, é necessário perguntar novamente sobre a queixa e duração paciente, com o objetivo de conferir se a queixa dita anteriormente é a mesma relatada pelo adolescente.  A seguir, deve-se refazer, também, as perguntas pertencentes ao HPMA

Além disso, realiza-se o interrogatório sobre os diversos aparelhos (ISDA). 

Embora alguns adolescentes sejam bastante jovens, perguntas sobre sexualidade devem ser feitas e, neste momento, é válido destacar, novamente, que o sigilo médico é garantido. 

Terceiro tempo

Nesta etapa da consulta, o foco recai sobre a avaliação física do adolescente, que compartilha semelhanças com os exames realizados em crianças e adultos. São empregados gráficos específicos para analisar as medidas antropométricas, incluindo peso, altura, índice de massa corporal (IMC) e pressão arterial. Esses dados são confrontados com os valores esperados para a faixa etária e comparados com as medições obtidas em consultas anteriores, permitindo uma avaliação da progressão do desenvolvimento.

O aspecto distintivo na avaliação física do adolescente reside na análise do desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários. Este processo envolve a avaliação do estágio de maturação das mamas e dos órgãos genitais, o qual fornece informações sobre o progresso da puberdade e a maturidade sexual.

Questões de prova de residência médica

Questões envolvendo avaliação do adolescente aparecem nas provas de residência médica e abordam, principalmente, a pauta do sigilo médico e quando deve ou não quebrá-lo. Abaixo, você pode treinar seus conhecimentos! 

1) R1 acesso direto – SUS-BA, 2022

Adolescente, 16 anos de idade, é levada à UPA pela mãe, por ter sido agredida fisicamente há, aproximadamente, 3 horas. O relato é de que o padrasto a espancou ao chegar, alcoolizado, em casa. O médico observa que a menor está tensa e retraída, limitando-se a responder com a cabeça às suas perguntas, enquanto a genitora relata o quadro que encontrou em casa. Identifique a atitude mais adequada do médico ao proceder à anamnese:

a) Solicitar a presença do padrasto durante a anamnese e acareá-lo para obter a verdade.

b) Solicitar que a menor faça o relato detalhado, examiná-la na presença da genitora.

c) Solicitar a presença de uma testemunha durante anamnese e o exame físico.

d) Solicitar à mãe que lhe permita uma conversa só com a menor, antes do exame físico.

2) R1 acesso direto – ENARE, 2021

O atendimento especializado ao adolescente é feito pelo pediatra ou hebiatra. Um tema de grande discussão é o sigilo médico para esses pacientes. Nesse sentido, analise a seguinte afirmação: É vedado ao médico revelar segredo profissional referente ao paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha capacidade de avaliar seu problema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo; salvo quando a não revelação possa acarretar danos ao paciente. Todos os jovens têm direito à privacidade. Essa afirmação está:

a) Correta.

b) Incorreta, pois, no caso de paciente menor de idade, os pais/responsáveis devem saber de tudo o que é conversado na consulta.

c) Incorreta, pois os adolescentes não têm capacidade de avaliação de seus problemas.

d) Incorreta, pois o segredo só pode ser contado quando puder acarretar danos a terceiros.

e) Incorreta, pois o risco de dano ao paciente não supera a obrigação médica quanto ao sigilo.

3) R1 acesso direto – EINSTEIN, 2023

Adolescente de 15 anos, boa aluna, comparece à Unidade Básica de Saúde (UBS), com sua amiga de mesma idade, porque acha que está grávida. É recebida pelo profissional de saúde, que a considera com bom desenvolvimento psíquico, orientada e muito preocupada com o que pode acontecer, questionando o médico sobre como será sua vida caso esteja grávida. Entre as condutas seguintes, a mais adequada para este caso é:

a) Atendimento pela enfermeira, realizar o teste de gravidez e se positivo, convocar os pais.

b) Não atender, convocar os pais ou responsável legal e encaminhar para ginecologista.

c) Não atender e solicitar que retorne com um responsável para poder realizar os testes e iniciar o pré-natal.

d) Atendimento pelo médico de família da UBS e dependendo do teste de gravidez iniciar pré-natal.

4) R1 acesso direto – FAMERP, 2023 

Adolescente feminina, 16 anos, saudável, estudante de ensino médio, procura atendimento na Unidade Básica de Saúde, sem acompanhante. Refere que já iniciou a vida sexual e gostaria de fazer uso da pílula anticoncepcional, apesar de utilizar preservativo. O médico que atende diz que só pode prescrever o método pedido após falar com um de seus pais ou responsável legal. Em relação a conduta do médico aponte a alternativa correta:

a) A conduta do médico foi adequada com a adolescente, pois é menor de idade, portanto, legalmente incapaz. É importante que seus pais ou o responsável legal saibam que ela tem vida sexual. Com anuência deles a pílula pode ser prescrita.

b) A conduta do médico não foi adequada com a adolescente, pois poderia prescrever a pílula anticoncepcional, desde que reforçasse a necessidade de continuar usando o preservativo e convocasse os pais ou responsável legal para deixá-los cientes da situação.

c) A conduta do médico não foi adequada com a adolescente, pois mesmo sendo menor de idade, a paciente mostra-se capaz de tomar decisões relativas á sua saúde e não há necessidade de comunicar aos responsáveis legais assuntos de sua vida sexual.

d) A conduta do médico foi adequada com a adolescente, pois ele deve exigir a presença dos pais ou do responsável, porque a pílula anticoncepcional está contraindicada para adolescente, pelo risco de abandono do uso do preservativo.

5) R1 acesso direto – SUS-BA, 2023 

Adolescente, sexo feminino, 15 anos de idade, levada à consulta de rotina por sua mãe. Reluta para permitir o exame físico. Ao conversar, sem presença materna, relata que tem se cortado com gilete nos antebraços, mas seus pais não tem conhecimento do fato pois tem usado mangas compridas para cobrir os ferimentos. Refere término de namoro com rapaz de 18 anos de idade, com quem teve iniciação sexual, de forma voluntária. Relata fazer uso de contraceptivos e deseja saber se deve continuar. Tem obtido notas medianas na escola. Define-se viciada em internet e jogos eletrônicos, passando mais de 6 horas por dia em uso de telas. Informa que tem poucos amigos. Ao exame físico: bom estado geral, lúcida, orientada; comunica-se pouco na presença da mãe; demonstra tristeza; fala sobre o namoro terminado, hipervalorizando a situação com conteúdo negativo. Demonstra sofrimento, autocrítica e baixa autoestima. Apresenta várias lesões cicatriciais em antebraços. Sem outros achados anormais. Indique a conduta médica adequada, definida pelas normativas éticas nessa situação com relação à mãe e à confidencialidade da consulta, do que diz respeito aos indícios de autoagressão.

a) A mãe deve ser informada no momento da consulta, sem a presença da paciente, pois há risco de vida por autoagressão.

b) Caso a paciente escolha uma pessoa adulta para interlocução essa deve ser, necessariamente, seu responsável legal.

c) Pode ser pactuado que a própria adolescente converse com a mãe, pois esta deve ser informada, já que há risco com a autoagressão

d) A mãe não deve ser informada, pois afetaria a autonomia da paciente, sendo o sigilo um direito do paciente adolescente.

Gabarito 

  1. D

É necessário conversar diretamente com a vítima, sem a presença de outros adultos próximos.

  1. A

A afirmação do enunciado resume as situações nas quais não é permitido quebrar o sigilo médico: quando o menor tem capacidade de avaliar e resolver seu problema, exceto quando a não revelação aos responsáveis traga danos ao paciente.

  1. D

O médico pode seguir com o acompanhamento normalmente e deve respeitar o sigilo.

  1. C

O adolescente tem direito a ser atendido sozinho em espaço privado e com sigilo, tendo garantia de confidencialidade, muito importante para abordagem de temas como sexualidade, uso de drogas, violência, entre outras situações.

  1. C

Pactuar com a adolescente que ela mesma informe à mãe sobre os atos de autoagressão é uma forma adequada de envolver a família nos cuidados, favorecendo que a quebra do sigilo ocorra com o consentimento.

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Giulia Gallucci
Giulia Gallucci
Estudante de Medicina. Entusiasta da organização e da atividade fisica.
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